Page 95 - revista_ato_topologia_e_desejo_do_analista_ano3_n3
P. 95
Viviane Gambogi Cardoso “... porque não é isso!” Nas dobras do Barroco

Lacan diz que essa hiância inscrita no próprio estatuto do
gozo, enquanto dit-mension (dimensão do dito) do corpo,
no ser falante, é o que reaparece com Freud através da exis-
tência da palavra. Onde isso fala, isso goza. O que não quer
dizer que isso saiba.

O inconsciente se desdobra em infinitas dimensões, no
mínimo três: real, simbólico, imaginário. Nessas entra-
nhas, algo de irredutível se coloca em suspensão. Negação.
Há do real no inconsciente.

Segundo Freud, “a negação é uma suspensão do recalque”
(FREUD, v. XIX, 1976, p. 296), um modo de tomar conhe-
cimento dele, porém não uma aceitação do que está recal-
cado. O resultado disso é uma aceitação intelectual do re-
calcado, persistindo o essencial ao recalque.

Analisando a função do julgamento, Freud diz que este é
uma continuação do processo original por meio do qual o
eu integra coisas a si ou as expele de si, de acordo com
o princípio de prazer. O mecanismo da simbolização se
fundaria em uma ausência e esta seria a função lógica da
Austössung, a exclusão de um sentido que, miticamente,
teria sido afirmado numa Bejahung. A polaridade de jul-
gamento, como diz Freud, parece corresponder à oposição
dos dois grupos de pulsão: a afirmação – como um substi-
tuto da união – pertence a Eros; a negativa – o sucessor da
expulsão – pertence à pulsão de destruição. O desempenho
da função de julgamento somente tornou-se possível com o
auxílio do símbolo da negativa, que dotou o pensar de uma

Revista da ATO – escola de psicanálise, Belo Horizonte, Topologia e desejo do analista, ano 3, n. 3, p. 87-97, 2017 93
   90   91   92   93   94   95   96   97   98   99   100