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Rosana Scarponi Pinto

que faça suplência à falha estrutural. Demanda e desejo se O gozo e a função do analista
articulam, compõem e organizam a superfície da lingua-
gem, com significações, metáforas e metonímias, repre- 81
sentantes formais do sujeito tórico. Essas voltas em torno
do buraco vão produzir um tipo de discurso, um modo de
gozo e o sintoma.

Há gozo no corpo, há gozo na linguagem, há gozo no
pensamento do obsessivo. Há um corpo que goza por
diferentes meios. Em “A Terceira”, Lacan (1974) vai
tratar da articulação entre o gozo e a linguagem através de
lalangue. Até mesmo, a palavra não é feita primariamente
para se comunicar, para dirigir-se ao outro, e sim para
gozar de si própria. A linguagem depende intimamente de
lalangue, porque é derivada dela. Do contrário, a linguagem
seria apenas comunicação, “palavras ao vento”. Lalangue
é transportada para a superfície do discurso através da
palavra, que carrega em si essa dupla inscrição do simbólico
e do real.

Nesse contexto, Lacan passa a questionar a pertinência de
se tentar operar sobre o gozo a partir do sentido da palavra,
porque esse sentido é um falso buraco. Não há esperança
de se alcançar o real pela representação. É de lalangue que
se opera a interpretação, pois é o real da estrutura, é o pri-
mário da linguagem, é matéria sonora, modulação, marcas
de afeto e de gozo que fazem parte da experiência do in-
consciente.

Para extrair lalangue da linguagem, o analista precisa tra-
balhar no plano da lógica, ou seja, no avesso da linguagem

Revista da ATO – escola de psicanálise, Belo Horizonte, Topologia e desejo do analista, ano 3, n. 3, p. 79-86, 2017
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